15.1.11

alguém degolou a nossa inocência. alguém usurpou os sonhos cândidos, sonhos esses onde divagávamos nas mais submersas e inócuas paisagens quiméricas do pensamento humano. campos de decessas, lajes gélidas e cinzentas, gravadas com nomes indecifráveis escritos à mão, flores fenecidas que brotavam podridão, e crianças brincando na orla do passeio engolido pelos braços extensos das árvores. um enorme núcleo de nuvens pálidas e ameaçadoras cobre o céu. alguém degolou a nossa inocência. a nossa juventude evaporou-se, estamos corroídos e derreados. abrimos a garganta da canície e agora caminhamos somente para a morte. alguém degolou a nossa inocência. não seremos mais dois pobres, incongruentes e alegres criaturas, seremos carrancudos, sisudos cadáveres. não habitaremos o dia e a noite, viveremos permanentemente na negrura. alguém degolou a nossa inocência, alguém nos privou do absurdo, das lamúrias supérfluas, da fortuna momentânea. este é o panorama, o tecido traseiro do nosso golpe final. eu aqui, tu aí, no mesmo sítio, no mesmo ardor, no mesmo solo, na mesma cova.




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